Se eu soubesse que
seria assim, não teria embarcado. Teria fugido antes mesmo de
começar. Não teria dado chance à sorte, ou ao azar, ou à vida,
que é o que realmente faz as coisas acontecerem. Mas o problema é
que foi tão devagarinho, tão sem perceber, que quando vi já estava
assim, perdendo o sono, perdendo a fome, perdendo a concentração e
a vontade de fazer qualquer coisa que não seja com você.
Só que você não
nota. Ou finge que não percebe. Você nem olha para mim, não de
verdade. Você quer minha companhia, quer minha presença, on-line ou
ao seu lado, fazendo aqueles programas que só a gente gosta. Mas ao
mesmo tempo me evita, parece ter medo do meu toque. Talvez perceba
meu coração pulsando e tema que eu tome uma providência,
arruinando esse nosso mundo particular, esse universo que construímos
onde somos só nós, e onde podemos ser completamente nós, sem
julgamentos e sem cobranças. Talvez tenha medo de me deixar
aproximar e de isso causar a ruptura, o fim da intimidade que
criamos. Ou talvez não tenha a menor noção de nada mesmo, e que
seja só a perfeita demosntração da falta de interesse.
Se eu soubesse que
seria assim, não teria deixado. Teria corrido para o lado oposto,
cancelado os passeios a dois, interrompido as conversas sem sentido
no meio do dia. O problema é que nem vi acontecer. Quando começou,
achei que a eletricidade ao toque era uma atração passageira,
tesão, urgência. Que os pêlos arrepiados e o frio na barriga a
cada encostadinha eram uma necessidade carnal, que com o tempo
passariam. Achei melhor evitar os toques, desviar os olhares, limitar
os esbarrões. Achei melhor colocar uns centímetros de distância
física na proximidade emocional.
Só que não passou. Os
arrepios se recusaram a partir. A eletricidade persistiu. De repente
já não era só amizade. De repente eu já não sabia o que era. Não
sentia necessidade, não sentia falta, não sentia saudade. Mas
sentia a tranquilidade da presença, a alegria de receber qualquer
mensagem besta, a vontade de estar perto. Você está apaixonada, as
amigas diziam. Mas eu negava. Não era paixão. Era outra coisa. Era
conforto, era uma sensação gostosa de estar em paz por ter você na
minha vida.
Se eu soubesse que
seria assim, juro que nesse momento teria puxado as rédeas. Teria
dado um tempo em tudo, especialmente em você. Mas eu não sabia.
Pensava que isso era tudo, que nossa amizade era uma daquelas
especiais e que estava segura ao seu lado. Eu não estava. Você não
é minha âncora, porque não percebe que estou afundando. E hoje já
não gosto mais de quem eu sou, não gosto de quem me tornei por
gostar de você.
Só que a culpa disso
tudo é minha. Você não fez nada. Aliás, se fez alguma coisa foi
tentar me afastar, procurando outros caras para mim. Eu devia ter te
contado ali, na lata, e te deixado. Ao menos por um tempo, até isso
tudo passar, até minha alma voltar a pertencer só a mim. Mas eu não
fiz isso e a paz se foi, a tranquilidade sumiu, e eu virei uma louca
psicopata, uma insana que pensa em você da hora que acorda à hora
que vai dormir, que stalkeia seus amigos, procura fotos da
ex-namorada, lê todos os comentários de fotos antigas e morre de
angústia quando você fica muitas horas sem dar sinal de vida. Virei
a mulher insegura e ridícula que sempre critiquei, que fica vendo
seus últimos movimentos on-line e imaginando com quem deve estar
falando, quem é essa pessoa tão interessante que te faz não ter
vontade de repartir seu dia comigo. Deixei meu ciúme me dominar. E
eu não gosto. Não gosto dessa pessoa que me tornei. Tenho raiva de
mim por me sentir assim. E não quero mais.
Nesse não querer mais,
resolvo sair com todos os caras que me enxergam e me querem, numa
tentativa alucinada de te tirar da cabeça. Nem que seja por um
momento. Nem que seja só um pouquinho. Nem que seja só para ter
outros assuntos sobre o que falar às minhas amigas e parar de
atormentá-las com minhas neuroses sobre você.
Quando a paixão
chegou, achei divertido. Há anos meu coração estava no limbo,
inerte, batendo pela força do hábito. Sempre foram os homens que me
escolheram, e não o contrário. Eu não era louca pelos meus ex.
Eles foram bons para mim, cada um a sua maneira. Eles eram perfeitos
para os momentos que vivemos juntos. Mas eu não era apaixonada. Eu
não os amava. Eles não me tiravam do chão nem do sério. Você
mudou isso, e eu gostei. Achei divertido voltar a sentir, mesmo que
platônica e desesperançadamente. Mas a intensidade de tudo agora me
assusta. Quando percebi, já tinha passado do limite. Eu não gosto
da pessoa que sou hoje e, se eu soubesse que seria assim, teria me
salvado você.
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