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quarta-feira, 27 de abril de 2016

Por que tem que ser assim?

Se eu soubesse que seria assim, não teria embarcado. Teria fugido antes mesmo de começar. Não teria dado chance à sorte, ou ao azar, ou à vida, que é o que realmente faz as coisas acontecerem. Mas o problema é que foi tão devagarinho, tão sem perceber, que quando vi já estava assim, perdendo o sono, perdendo a fome, perdendo a concentração e a vontade de fazer qualquer coisa que não seja com você.
Só que você não nota. Ou finge que não percebe. Você nem olha para mim, não de verdade. Você quer minha companhia, quer minha presença, on-line ou ao seu lado, fazendo aqueles programas que só a gente gosta. Mas ao mesmo tempo me evita, parece ter medo do meu toque. Talvez perceba meu coração pulsando e tema que eu tome uma providência, arruinando esse nosso mundo particular, esse universo que construímos onde somos só nós, e onde podemos ser completamente nós, sem julgamentos e sem cobranças. Talvez tenha medo de me deixar aproximar e de isso causar a ruptura, o fim da intimidade que criamos. Ou talvez não tenha a menor noção de nada mesmo, e que seja só a perfeita demosntração da falta de interesse.
Se eu soubesse que seria assim, não teria deixado. Teria corrido para o lado oposto, cancelado os passeios a dois, interrompido as conversas sem sentido no meio do dia. O problema é que nem vi acontecer. Quando começou, achei que a eletricidade ao toque era uma atração passageira, tesão, urgência. Que os pêlos arrepiados e o frio na barriga a cada encostadinha eram uma necessidade carnal, que com o tempo passariam. Achei melhor evitar os toques, desviar os olhares, limitar os esbarrões. Achei melhor colocar uns centímetros de distância física na proximidade emocional.
Só que não passou. Os arrepios se recusaram a partir. A eletricidade persistiu. De repente já não era só amizade. De repente eu já não sabia o que era. Não sentia necessidade, não sentia falta, não sentia saudade. Mas sentia a tranquilidade da presença, a alegria de receber qualquer mensagem besta, a vontade de estar perto. Você está apaixonada, as amigas diziam. Mas eu negava. Não era paixão. Era outra coisa. Era conforto, era uma sensação gostosa de estar em paz por ter você na minha vida.
Se eu soubesse que seria assim, juro que nesse momento teria puxado as rédeas. Teria dado um tempo em tudo, especialmente em você. Mas eu não sabia. Pensava que isso era tudo, que nossa amizade era uma daquelas especiais e que estava segura ao seu lado. Eu não estava. Você não é minha âncora, porque não percebe que estou afundando. E hoje já não gosto mais de quem eu sou, não gosto de quem me tornei por gostar de você.
Só que a culpa disso tudo é minha. Você não fez nada. Aliás, se fez alguma coisa foi tentar me afastar, procurando outros caras para mim. Eu devia ter te contado ali, na lata, e te deixado. Ao menos por um tempo, até isso tudo passar, até minha alma voltar a pertencer só a mim. Mas eu não fiz isso e a paz se foi, a tranquilidade sumiu, e eu virei uma louca psicopata, uma insana que pensa em você da hora que acorda à hora que vai dormir, que stalkeia seus amigos, procura fotos da ex-namorada, lê todos os comentários de fotos antigas e morre de angústia quando você fica muitas horas sem dar sinal de vida. Virei a mulher insegura e ridícula que sempre critiquei, que fica vendo seus últimos movimentos on-line e imaginando com quem deve estar falando, quem é essa pessoa tão interessante que te faz não ter vontade de repartir seu dia comigo. Deixei meu ciúme me dominar. E eu não gosto. Não gosto dessa pessoa que me tornei. Tenho raiva de mim por me sentir assim. E não quero mais.
Nesse não querer mais, resolvo sair com todos os caras que me enxergam e me querem, numa tentativa alucinada de te tirar da cabeça. Nem que seja por um momento. Nem que seja só um pouquinho. Nem que seja só para ter outros assuntos sobre o que falar às minhas amigas e parar de atormentá-las com minhas neuroses sobre você.

Quando a paixão chegou, achei divertido. Há anos meu coração estava no limbo, inerte, batendo pela força do hábito. Sempre foram os homens que me escolheram, e não o contrário. Eu não era louca pelos meus ex. Eles foram bons para mim, cada um a sua maneira. Eles eram perfeitos para os momentos que vivemos juntos. Mas eu não era apaixonada. Eu não os amava. Eles não me tiravam do chão nem do sério. Você mudou isso, e eu gostei. Achei divertido voltar a sentir, mesmo que platônica e desesperançadamente. Mas a intensidade de tudo agora me assusta. Quando percebi, já tinha passado do limite. Eu não gosto da pessoa que sou hoje e, se eu soubesse que seria assim, teria me salvado você.
 
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